quinta-feira, 31 de maio de 2012

Crime individual com conta coletiva


Praticado sobretudo durante as férias de verão, o abandono de animais  traz sérios riscos para as cidades e transfere a responsabilidade de poucos para toda a sociedade


Por Tulla Velho


O abandono de animais é uma triste e comum realidade dos grandes centros urbanos. Só na cidade de São Paulo estima-se cerca de 100 mil cães e gatos que vivem nas ruas. Segundo dados do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ), o índice de abandono no período de férias de verão, entre dezembro e janeiro, cresce 30%. Isso acontece porque os donos vão viajar e não procuram uma alternativa para seus animais de estimação. Além de viagens, também existe o problema de adaptação quando, por exemplo, a família muda-se de uma casa para um apartamento menor. É comum os donos deixarem o animal na antiga casa e irem embora.

Uma fonte que não quis se identificar contou que já abandonou um cachorro “por ele não ter se tornado um bom cão de guarda”. O temperamento dócil do animal era o oposto do que o ex-dono procurava quando o comprou. Outra fonte que também não quis ser identificada disse que "por não ter mais tempo de cuidar e nem de procurar uma ONG ou instituição" abandonou seu gato de nove anos de idade na rua.

A idade do animal também é um problema. Muita gente abandona seus pets quando eles ficam velhinhos e além de não servirem mais para cuidar da casa, começam a dar problemas, como os de saúde. Em geral, o grande motivo de abandono é a posse irresponsável, que acontece quando alguém decide adotar ou comprar um animal e desconhece o trabalho que ele exige como alimentação, tempo, cuidados com higiene, custos veterinários, além de carinho e dedicação.

Essa realidade atinge de forma direta todo e qualquer cidadão, inclusive os que não têm nem querem ter um animal de estimação. É uma questão de saúde e segurança pública com a qual as cidades têm de lidar diariamente. Diversas doenças como toxoplasmose, leptospirose, larvas migrans (popularmente conhecidas como "bicho geográfico"), são transmitidas através de animais infectados. É necessário um trabalho contínuo dos Centros de Controle de Zoonoses para efetivamente "controlar" essas doenças. Sem falar as questões de segurança. O CCZ registra anualmente 15 mil atendimentos por mordeduras ou arranhaduras nas redes públicas de hospitais. Muitos dos animais que estão jogados nas ruas também causam inúmeros acidentes de trânsito e atropelamentos.

Anjos-da-guarda

sac: http://sac.prodam.sp.gov.br/
bo: http://www.ssp.sp.gov.br/bo
Abandonar um animal, por qualquer motivo, é crime previsto na Lei Federal Nº 9.605, a “Lei dos Crimes Ambientais. Em seu artigo 32, a lei diz que: "praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos" pode acarretar pena de três meses a um ano de prisão e multa, aumentada de um sexto a um terço se ocorrer morte do animal.

Se existem pessoas capazes de abandonar animais, do outro lado existem as que zelam pelo bem estar deles. Os chamados "protetores independentes" são pessoas que, sem apoio de instituições, alimentam, medicam, procuram futuros lares pros animais e até os recolhem para dar abrigo em suas próprias casas. "A gente é consequência dos que abandonam" conta a psicóloga Rita Duarte, que cuida de gatos nas ruas de Santos e atualmente possui 17 dentro de casa. Ela explica que alimenta os gatos adultos e saudáveis criados nas ruas, mas os que ainda são filhotes, acaba levando para casa por medo do que possa acontecer, e depois que se apega não consegue encaminhar para adoção. "Geralmente, a gente não escolhe ter essa quantidade de animais, mas as pessoas sabem que temos dez, então abandonam mais uma ninhada de cinco na sua porta, porque sabem que nós não conseguimos nos omitir diante dessa situação."

Comum realidade: cão sem dono dorme em rua de São Paulo (foto: reprodução)
Rita também cita o caso de um morador de rua que, ao começar a dividir sua própria comida com alguns gatos da região, agora encontra-se cheio de animais, muitos deles deixados por pessoas que têm um bom padrão de vida. Para a psicóloga, o descaso é grande e falta foco a essas pessoas que não castram e abandonam, repassando seus problemas para pessoas como ela.“Tudo isso é consequência da arrogância do ser humano em se sentir superior a qualquer ser vivo, como se o outro não sentisse dor, não sentisse as mesmas coisas que a gente sente".

 
Jogar um animal na rua nunca deve ser uma opção. Se a decisão de se desfazer do bichinho for realmente tomada, independente do motivo,  a doação é a melhor saída. Existem diversos sites como o Cachorro Perdido que, além de divulgar anúncios de animais perdidos (como já diz o nome), também veicula anúncios de animais para doação. Fotos, compartilhamentos em redes sociais, cartazes espalhados em clínicas veterinárias, pet shops, classificados em jornais, tudo isso auxilia no processo de busca de um novo dono. Além de evitar ainda mais problemas pra cidade, evita também o sofrimento desses animais, que têm como destino fome, frio, maus tratos, doenças, mortes e sacrifícios.



Nenhum comentário:

Postar um comentário