segunda-feira, 14 de maio de 2012

Programa para índio

Inclusão de indígenas no ensino superior fomenta a diversidade nas universidades e pode melhorar condições das comunidades de origem dos alunos

Por Ariane Melo
 

O estereótipo do índio exótico, de pele vermelha que anda nu pela sela selva há muito tempo não dá conta da realidade. E ficou ainda mais démodé depois que jovens e adultos indígenas passaram a ingressar em universidades públicas e privadas, encorajados pelas leis de cotas sociais e incentivos de instituições de ensino. 

Os indígenas buscam o conhecimento necessário para provocar melhorias em suas comunidades e gerar oportunidades de desenvolvimento. Evitando se distanciar de sua identidade original, eles querem agregar novos valores e ser reconhecidos como parte da totalidade do povo brasileiro.




Daniel Munduruku, escritor indígena formado em Filosofia, com licenciatura em História e Psicologia, e doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (USP), aos 9 anos aprendeu a negar o próprio idioma para continuar na escola. Nessa ocasião, prometeu á si mesmo que não seria mais índio, e sim astronauta. “Ser índio era ruim, meus colegas provocavam muitas brigas”.

Ao se recordar do dia em que seu avô o levou até um igarapé para lhe aconselhar que a vida tem de ser igual ao rio, que corre para encontrar alternativas, ele admite: “...até aquele momento não sabia que o rio falava. É preciso ser água corrente o tempo todo”, disse Munduruku.

Pindorama, como o Brasil era chamado pelos nativos indígenas, foi o nome escolhido para o programa de inclusão social da PUC, criado em 2001 em parceria com a Pastoral Indigenista da Arquidiocese de São Paulo, entre outras entidades. O programa tem a colaboração da associação indígena SOS Pankararu, que visa oferecer bolsas de estudos para alunos indígenas.

Cotas e bolsas

Benedito Prezia, coordenador do Pindorama, comenta que um dos objetivos da iniciativa é fazer com que os alunos tenham condições de influenciar as políticas públicas. “A ideia é fazer com que os jovens indígenas possam se qualificar para competir em pé de igualdade com os demais jovens do Brasil; formá-los para que se tornem lideranças em suas próprias comunidades e tentar influir nas políticas públicas do seu município, estado e país”.

O Programa Pindorama disponibiliza 12 vagas anualmente. Segundo a universidade, 74 indígenas de doze etnias diferentes já passaram por ele desde o início do projeto e 49 alunos se formaram. Para a admissão, os alunos devem morar em São Paulo, uma exigência da Fundação Nacional do Índio (Funai). Os cursos mais procurados são Letras, Pedagogia, Serviço Social, Gestão Ambiental e Tecnologia e Mídias Digitais.

Para os alunos índios, o acesso ao conhecimento e às tecnologias, é uma maneira de amparar e fortalecer as suas comunidades de onde vieram. Emerson, da etnia Nhandeva (Paraná), formado pela PUC, conta que desejava cursar Ciências Sociais porque sempre esteve ligado às questões sociais “Escolhi o curso para entender melhor a problemática envolvendo os assuntos indígenas”.

Eurico Sena, da etnia baniwa, (alto Rio Negro, AM) e graduado em Filosofia, Teologia e Direito, aponta as contradições no caminho dos indígenas universitários. “O estatuto do Índio diz que, se você sair da aldeia, você não é mais índio. Eu fico brincando com eles então que uma hora eu sou índio, uma hora eu não sou. Parece que eu estou brincando de ser e não ser índio. Na verdade, não existe isso, se você vai para os Estados Unidos você é brasileiro lá e aqui, não importa... Eu tenho que me sentir bem trabalhando aqui numa empresa como consultor de marketing e me sentir bem lá na comunidade indígena, pescando, flechando, comendo peixe assado. Eu sou eu mesmo”, disse Sena para a publicação Psicologia e povos indígenas do Conselho Regional de Psicologia.

Joilda, pedagoga, Pankararé (Brejo do Burgo, Bahia), conta que “nas aulas era respeitada pelos professores e colegas. Só sofri um pouco de preconceito no último semestre por causa de minha cor de pele, branca, por uma professora da pós-graduação. Foi difícil para os alunos de minha classe compreender que hoje o indígena faz faculdade e entra no mercado profissional para concorrer com eles. Eu era direta com eles: fazemos isso para sobreviver, para continuarmos vivos, porque se depender dos não indígenas e das autoridades vamos ser extintos!”.

“Quanto mais conhecimentos adquirimos, mais somos capazes de lutar por nossos direitos e cada vez mais nos reafirmarmos enquanto indígenas,” defende Andreia, da etnia Pankararu (Pernambuco), graduada em Publicidade e Propaganda pela Universidade Cruzeiro do Sul.












 

Um comentário:

  1. Oi Ariane! sussa?

    Curti muito sua matéria, pois além de ser uma obra jornalística traz um tema pouquíssimo tratado pela mídia, seja ela impresa, TV/rádio ou internet! Como a Karina comentou uma vez em aula, o jornalista não pode ter preconceitos. Acho que você foi por este caminho!

    Beijos
    Leandro

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